Durante o anúncio oficial do vencedor do segundo turno das eleições presidenciais, uma repórter, distraidamente, perguntou ao presidente do TSE se a formidável vantagem obtida pelo candidato à reeleição (o presidente Lula) sobre o seu adversário conferir-lhe-ia “maior legitimidade” para governar o país por mais quatro anos. Ao que o ministro, igualmente distraído, respondeu afirmativamente.
Foi instituído, desse modo, em nossa jovem democracia, o legitimômetro eleitoral. Trata-se dum mecanismo cujo escopo é a aferição do grau de legitimidade de um governante eleito. Em que pese a Constituição Federal exigir o escore de 50% dos votos mais um para considerar eleito um presidente – e, portanto, democrática e constitucionalmente legitimado para conduzir o seu mandato por quatro anos –, o estabelecido na Carta Magna, ao que parece, não satisfaz.
O fato de o candidato obter “apenas” a maioria dos votos não seria suficiente para considerá-lo “realmente” legítimo. O raciocínio é o seguinte: a simples maioria poderia fragilizar o governante eleito, a ponto de incitar a possibilidade de um, digamos, terceiro turno, desta feita nos tapetes do Congresso, mediante o recurso do impeachment.
O legitimômetro surge justamente para apaziguar tais inquietações, outorgando mais segurança e tranqüilidade ao processo democrático. Tal qual a urna eletrônica, é invenção tupiniquim. Veja lá se alguém ousou questionar a legitimidade de George W. Bush para governar os Estados Unidos, por ocasião de seu primeiro mandato, quando ele não obteve sequer a maioria dos votos diretos. Mesmo o maior prejudicado, o adversário democrata Al Gore – que abandonou a política para divulgar a causa ambientalista mundo afora –, jamais se atreveu a discutir o nível de legitimidade do presidente da maior potência do mundo.
Ao medir o grau de legitimidade, o legitimômetro registra o grau de liberdade que o governante eleito possui. Estando no nível superior, decerto que o governante pode pôr em prática projetos polêmicos, como o da gestão de florestas públicas na Amazônia.
Aliás, como o longo prazo é da natureza das políticas florestais, em vista do longo período de maturação dos povoamentos e do ciclo de corte (no caso da Amazônia) de aproximados 25 anos, políticos que se aventuram nessa seara precisam de índices elevados de legitimômetro.
Certamente que os índices de Lula, Jorge Viana e Marina Silva são altos. Os de Binho Marques, próximo governador eleito do Acre, necessariamente terão que sê-lo. Um projeto político que se ancore na sustentabilidade de uma economia florestal capaz de superar as tentações da produção de soja e gado depende da definição e operacionalização de política florestal duradoura.
Por outro lado, os resultados concretos de uma política florestal que permitam medir sua efetividade dependem de horizonte temporal de, no mínimo, 30 anos. Nesse caso, há somente duas opções: impregnar as estruturas da ação pública, incluindo aí as organizações do terceiro setor, para que a política florestal seja assimilada como política de estado, e não de governos; ou esperar que os governantes futuros também acreditem no potencial florestal da região.
É claro que, na segunda hipótese, há a necessidade de elevados índices de legitimômetro.