A largura legal da faixa de mata ciliar do rio Acre, estabelecida pelo Código Florestal em vigor, não permite que a quantidade de florestas ali presente cumpra sua função com relação ao equilíbrio hidrológico do rio, sobretudo no que se refere à redução dos riscos de ocorrência de seca e alagações.
A largura legal da mata ciliar foi um dos temas mais polêmicos durante as discussões que culminaram na aprovação do novo Código Florestal, em maio de 202.
De um lado, a grande maioria dos parlamentares, defensora da expansão da área de terra destinada ao plantio de soja, capim e outros cultivos, considerava que a mera existência de uma faixa de floresta nas margens dos rios, em especial diante da imensa hidrografia que caracteriza a Amazônia, é prejudicial ao agronegócio, na medida em que reduz os solos disponíveis para o exercício da atividade.
De outro lado, uma minoria de parlamentares, com o apoio do movimento ambientalista, defendia a permanência da largura mínima de faixa de mata ciliar prevista no Código Florestal de 965. Ou seja, com receio de que ocorresse um retrocesso, procurava-se garantir, pelo menos, o que a legislação anterior determinava.
Mediante estudo então divulgado pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC e Academia Brasileira de Ciência – ABC, foi comprovada a estreita relação que existe entre a quantidade de florestas presentes ao longo das margens de um rio – isto é, a largura da faixa de mata ciliar – e o equilíbrio hidrológico desse respectivo curso d”agua.
Os cientistas demonstraram ainda que a ampliação da largura legal da mata ciliar não comprometeria a produção do agronegócio – ao contrário, auxiliaria no aumento da produtividade, o que, evidentemente, era muito mais importante.
Faltava analisar os impactos econômicos que a ampliação da faixa de mata ciliar poderia ter sobre a propriedade rural e para o agronegócio.
Estudo decisivo levado a cabo pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, o Ipea, órgão de assessoria técnica do Governo Federal, reforçou a tese de que o serviço prestado pela mata ciliar na quantidade e na qualidade da água que flui no rio compensaria eventual perda de área cultivada pelo agronegócio.
Se (e somente se) os parlamentares, antes de assumir posicionamentos em matérias de cunho técnico-científico, tivessem o hábito de ouvir os cientistas da SBPC/ABC, ou ainda os renomados economistas do Ipea, o novo Código Florestal teria ampliado a largura da mata ciliar, e o quadro atual da crise da água poderia ser outro.
Mas, infelizmente, não é assim que funciona o trabalho legislativo. Parlamentares com pouca formação, indiferentes à ciência, costumam ser induzidos por justificativas e motivações que ferem o bom senso.
Sem embargo, a despeito do anacronismo que permeou a votação da legislação aprovada em âmbito federal, estados e municípios podem legislar sobre o tema. Significa dizer que leis estaduais e municipais podem ampliar a largura da mata ciliar, nunca reduzi-la.
A boa notícia é que os pesquisadores conceberam metodologia específica para chegar-se a uma “largura técnica” de mata ciliar, levando-se em conta as peculiaridades de um determinado trecho de rio. Uma largura adequada, sob o ponto de vista técnico-ecológico, para a conservação da água, e calculada para melhorar o desempenho das formações florestais presentes na mata ciliar, em relação ao equilíbrio hidrológico do rio.
O caso do rio Acre é sintomático. Com alagações e secas ocorrendo todos os anos desde o final da década passada, parece ser o momento de escutar o alerta da ciência.
Mais que sujar os pés de lama, os gestores públicos devem empenhar-se, no propósito de ampliar a largura da faixa de mata ciliar do rio Acre. Esse é o caminho!